terça-feira, outubro 23, 2007

 

Zélia Gattai (II)


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Zélia deu um depoimento sobre sua "tardia" profissão de escritora, numa entrevista concedida à revista Caros Amigos (em julho/99), na qual conta também algumas historinhas pitorescas:

Zélia Gattai não lamenta ter começado a escrever só com 63 anos de idade. Trata-se de apenas uma circunstância. Uma contingência. Afirma:

_ Acho até bom que tenha sido assim. Só escrevo memórias e quem escreve memórias precisa, antes de tudo, ter vivido. E vivido muito. Outra coisa: para escrever memórias é preciso ter amadurecido na existência. E mais: não pode ter ódios, desejo de se vingar de alguém. Para escrever memórias é preciso ter um olhar para o passado com bom sentimento. As memórias, no fundo, representam um ensinamento da vida.
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Ela lembra que Jorge Amado participa de todos os seus livros única e exclusivamente como personagem. Não interfere em nada, quando os livros estão sendo escritos. Não dá palpite. Aliás, deu palpite, sim, mas uma vez. Foi quando Zélia escreveu Crônica de uma Namorada, em 1994. Os dois passavam temporada em Paris. De repente, Zélia começou a se mostrar aflita. Inquieta, andava de um lado para outro, em silêncio. Jorge quis saber o que estava ocorrendo, Zélia decidiu dizer:

_ Olha, Jorge, é que não consigo mais levar o romance adiante. Perdi o controle dos personagens. Um deles está querendo abusar de uma prima bem mais nova. Já se aproveitou dela, mexeu nela. Pior de tudo é que a menina está gostando. Não sei o que fazer com ele.

Jorge Amado olhou Zélia de alto a baixo e fez apenas um comentário que foi também uma sentença:

_ Zélia, não se meta na vida dos outros!

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(...) As pessoas quase sempre confundem Jorge Amado e Dorival Caymmi. Zélia, no entanto, diz que de parecido os dois só têm a cabeça branca. Certa vez, Jorge e Caymmi foram ao terreiro de Mãe Menininha do Gantois. O terreiro estava cheio de turistas. Foi um alvoroço. Uma senhora do grupo chegou-se junto a Jorge e perguntou:
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_ O senhor não é o Dorival Caymmi?

_ Não sou Dorival Caymmi, mas sou o irmão dele!
– respondeu Jorge Amado.
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Certa vez perguntaram a Caymmi:

_ Jorge Amado, como vai o livro?

Caymmi não se fez de rogado:

_ Vai indo, vai indo!
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Outra história: um dia, Vinicius de Moraes passou o dia inteiro na casa do Rio Vermelho. Ao sair, início da noite, foi cercado por um grupo de jovens na calçada. Todos queriam um autógrafo:

_ Seu Caymmi, assina aqui no meu livro!

E Vinicius deu dezenas de autógrafos assinando Dorival Caymmi, Dorival Caymmi, Dorival Caymmi...
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Com Zélia a confusão ocorreu da mesma maneira quando, certa vez, numa tarde, visitou Mãe Menininha do Gantois. Perguntou a um preto velho sentado junto à janela se Mãe Menininha estava em casa.

O preto gritou:

_ Ô Lucinha, avise a Mãe Menininha que a mulher do seu Carybé está aqui.

Zélia Gattai se apressou em corrigir:

_ Não sou mulher de Carybé, não! Sou a mulher de Jorge Amado!

O preto velho não se perturbou. Apenas disse:

_ É tudo a mesma coisa!


Comments:
Clélia, lá em casa temos muuuuitos livros antigos. Meu marido tem vários do Jorge Amado, que não é o tipo de leitura que eu gosto. Um dia, procurando alguma coisa pra ler, achei dois livros da Zélia (Anarquistas e Um chapeu para viagem). Comecei a ler e simplesmente adorei. Muito bom mesmo. estão velhinhos, surrados, mas os textos são ótimos. Meu número.
Bjs
 
Oi Lu!

Gosto das histórias da Zélia, ricas em detalhes, sensibilidade, deliciosamente contadas! Acredito que seus livros sejam pra se degustar e ficar com o sabor na memória...

Bom vê-la por aqui, faz um tempinho que não a visito. Irei lá!

bjo gde,
Clé
 
Clélia
Que delícia este teu blog, só que tenho entrado correndo e aqui dá vontade de ficar. Eu volto pra ler tudo o que postaste sobre a Zélia Gattai com alma.

Bjs.
 
Oi, Rosa! Saudade das suas visitas...

Volte, sim, com calma. Ler a Zélia é sempre um prazer! Eu adoro.

bjo,
Clé
 
"[...]precisa, antes de tudo, ter vivido."

Vendo Zélia e Jorge, lembro-me de uma poetisa daqui de onde moro.
Aqui em Praia Grande temos uma personagem muito especial. Dona Elza Lemke Batalha.
Aos 71 anos, viuva há 20, começou a escrever poesias, após se apaixonar por seu atual marido.
E como escreve!
No ano de 2002, aos 81 anos, se casou e aos 82 lançou seu primeiro livro. Realização!
Faz um tempo que não a vejo, pelas correrias da vida, mas sempre que o faço, me alimento daquela alma doce e cheia de palavras belas para passar.

Muito bom ter em nosso mundo palavras de pessoas que traduzem e colorem nossas realidades, com frases, poemas e experiências...

Beijo, Clélia
:-]
 
Verdade, Eli.
bjo,
Clé
 
kkkkkkkkk....essa confusão é hilária.
Eu gosto dos livros de memória do estiloa da Zélia, acho reconfortante.;0)
 
Não é?

Também gosto de livros de memórias & biografias.

Bom vê-la por aqui,Vivien, mesmo com sua dificuldade de leitura...

bjão,
até amanhã!
 
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