quinta-feira, agosto 02, 2007
A CASA DE PAPEL (III)

Temos, aqui em casa, o hábito de ler na varanda, ao som do mensageiro de vento (se o dia, ou noite for de ventania); na sala, mais raramente, e no quarto, mais freqüentemente. O ruim, no entanto, em se ler deitado, é ter de segurar o livro. E, quando bate o sono, invariavelmente, ele nos cai das mãos, na cama ou no chão! Segundo Arnaldo, quando ele começa a ler o mesmo parágrafo umas 3 vezes é sinal de que deve fechar o livro, os olhos e dormir. Um mau livro é um bom sonífero, considera ele! E aí, reluta se continua ou não a lê-lo. Quer sempre dar-lhe uma chance. Arnaldo não desiste fácil. É uma de suas características. Gosto de ler no silêncio ou com música instrumental. Músicas cantadas tiram-me a concentração. Há também um volume certo, que não se sobrepõe ao texto lido, mentalmente. Cecília, não sei como, consegue ler com TV ligada, música alta, computador sinalizando que chegou um recado do MSN! Todos estes detalhes, de local e modo de leitura, vêm ao encontro deste trecho do livro de Carlos Maria Domínguez, que transcrevo:
“(...) Que caminho havia encontrado, um homem inteligente como ele, para os livros? Brincava com eles como uma menina com suas bonecas? Organizava-os com uma especulação meditada sobre seu sentido? Procurava confrontar-se com uma figura de papel e tinta? Não sei. Mas o que acabou por abatê-lo foi um acidente que nunca se perdoou e de cujo destroço fui testemunha involuntária.
“Já fazia dois meses, haviam me dito, que ele se dava o gosto de ler os franceses do século XIX à luz de velas, para o que utilizava um candelabro de prata. Tempos atrás, havíamos conversado sobre isso, porque também eu desfruto ler Goethe enquanto uma ópera de Wagner toca no aparelho de som ou, digamos, acompanhar Baudelaire com Debussy. É parte da viagem e posso lhe assegurar que o gozo é superior, em todos os sentidos. A propósito: saiba que quando lemos em voz baixa emitimos o som das letras numa freqüência imperceptível. Mas não calamos o som. A voz está ali, baixa, nunca ausente. Executa a linha como a partitura um instrumento e posso lhe assegurar que é tão essencial como o sentido da visão. Isso cria um tom, uma melodia que percorre as palavras e fraseados, de modo que quando se lhe adiciona música, a um volume suave, gera-se um contraponto harmônico na profundidade do tímpano, entre a sua própria voz e a das caixas de som. Se se passa de alguns decibéis, a música cobre sua voz e mata a do texto. Não só isso, engana-o. Uma prosa ruim, acompanhada por um bom concerto, ele pode fazê-la parecer muito melhor do que é.
“Brincávamos com a idéia de adicionar a luz das velas, só no caso das obras anteriores à luz elétrica. Pode lhe parecer uma excentricidade totalmente desnecessária, mas experimente iluminar um quadro a óleo com velas e notará que ele ganha um aspecto completamente diferente do de costume, por mais bem iluminado que esteja. É um quadro novo, as sombras ganham vida e, dir-se-ia, já não há diferença essencial entre a luz que nasce dos pigmentos e o óleo e o quarto em que se encontra. Os espaços se prolongam e o senhor ingressa numa dimensão reveladora.
“Algo parecido acontece com certos livros porque uma página é, também, um formidável desenho. Um jogo de linhas e pequenas figuras que se reiteram, de vogal em consoante, com suas próprias leis de ritmo e composição, e nunca é indiferente o corpo, a letra escolhida, a medida das margens, a solvência do papel, a numeração à direita, centrada, a infinidade de detalhes que lhe dão seu préstimo. Por mais nova que seja a edição e branco o papel, à luz dos círios se tinge de uma pátina que introduz valores, matizes, com maravilhoso encanto. E como se desfrutam os corredores.”
_ Que corredores? – perguntei, perturbado.
_ Olhe, é uma velha discussão. Ninguém sabe com certeza se se trata do talento do autor ou das bondades da edição. As opiniões estão divididas. Mas, para muitos leitores, basta olhar os corredores para saber se um livro é bom e merece sua leitura.
Foi até sua biblioteca, pegou uma antiga edição de Eugênia Grandet e colocou-a nas minhas mãos. Pediu-me que a abrisse e procurasse, em qualquer página, ruas verticais ou diagonais, desenhadas pelas separações entre as palavras. Realmente, descobri longas ruas que se prolongavam linha a linha, cruzavam os parágrafos, algumas vezes se interrompiam e retomavam um trajeto diagonal, da direita para a esquerda, da esquerda para a direita, ou em queda livre.
_ Um escritor sem ritmo no fraseado não pode conseguir isso. Se maltrata a língua com duas ou três palavras com mais de quatro sílabas numa só frase, necessariamente quebrará a rua e, claro, o ritmo também. O senhor as procura na página e não as encontra. Uma edição infame, com uma caixa pequena demais ou grande demais, violentará também essas figuras que o olho contempla, digamos, em segredo.
“Brauer se inclinava a pensar que o fenômeno dava a medida do escritor, a hierarquia de um estilo. Mas eu não estou certo disso.”
Entreguei-lhe o livro, sugestionado, depois de comprovar que os corredores se repetiam página a página e formavam estranhas figuras. (...)”
["A Casa de Papel", de Carlos Maria Domínguez, 2006, Editora: Francis, pp. 56 a 60]
Pro Arnaldo, meu companheiro adorável, dentre tantas outras coisas, de leitura.
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círio [Do lat. cereu]
Substantivo masculino.
1. Vela3 (3) grande, de cera.
2. Procissão que, partindo de determinado lugar, vai levar um círio a outro lugar. [Cf., nesta acepção, ladairo e sírio.]
círio [Do lat. cereu]
Substantivo masculino.
1. Vela3 (3) grande, de cera.
2. Procissão que, partindo de determinado lugar, vai levar um círio a outro lugar. [Cf., nesta acepção, ladairo e sírio.]
sírio 1 [Do gr. Seírios, pelo lat. Siriu]
Substantivo masculino.
1. Astr. Grande estrela da constelação do Cão Maior. [Sin.: Canícula (vulg.) e Siro (p. us.). Cf. círio. Com cap.]
sírio 2
Substantivo masculino.
1. Bras. Saco para transportar farinha de mandioca. [Cf. círio.]
sírio 3 [Do gr. sWrios, pelo lat. syriu]
Adjetivo.
1. Da, ou pertencente ou relativo à Síria (Ásia).
Substantivo masculino.
2. O natural ou habitante da Síria. [Sin. pop. (no AM): judeu.]
3. Gloss. V. árabe (3).
4. Vocábulo do sírio3 (3). [F. paral. (p. us.): siro. Fem.: síria. Cf. círio.]
Substantivo masculino.
1. Astr. Grande estrela da constelação do Cão Maior. [Sin.: Canícula (vulg.) e Siro (p. us.). Cf. círio. Com cap.]
sírio 2
Substantivo masculino.
1. Bras. Saco para transportar farinha de mandioca. [Cf. círio.]
sírio 3 [Do gr. sWrios, pelo lat. syriu]
Adjetivo.
1. Da, ou pertencente ou relativo à Síria (Ásia).
Substantivo masculino.
2. O natural ou habitante da Síria. [Sin. pop. (no AM): judeu.]
3. Gloss. V. árabe (3).
4. Vocábulo do sírio3 (3). [F. paral. (p. us.): siro. Fem.: síria. Cf. círio.]